sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Opinião: Dessincronia

Desorganização no trânsito, falta de prioridade ao transporte público e falta de educação dos motoristas são problemas antigos no Brasil, sem avanços significativos para a soluçãoDesorganização no trânsito, falta de prioridade ao transporte público e falta de educação dos motoristas são problemas antigos no Brasil, sem avanços significativos para a solução

O Brasil traz em sua história a marca da dessincronia entre o discurso e a prática, um confronto antigo entre o moderno e o retrógrado. Foi assim no século 19, quando nossa sociedade escravista contrastava com as ideias do liberalismo europeu. Parte de nossas elites propalava o ideário liberal num universo em que predominava escandalosamente a mão de obra escrava.
O jornalista Raul Juste Lores, em artigo para o UOL, mostra como esse descompasso entre o moderno e o atraso permaneceu no terreno da mobilidade urbana. Quando da construção do Minhocão, em novembro de 1969, ele lembra que “Nova York tinha cancelado havia pouco um projeto similar. Elevado cortando área densamente povoada era considerado equívoco”. Mais à frente em seu texto Lores lembra que, quarenta anos depois, o governo do estado de SP repetiria o gesto de privilegiar o automóvel ao investir vultosas somas na construção de novas pistas nas marginais. Enquanto sufocava o já poluído rio Tietê, “Nova York e Madri estavam reduzindo asfalto nessas margens para seus rios respirarem”.
As recentes gestões do governo da União repetiram mais do mesmo, mas ao invés de obras vultosas, preferiram investir na multiplicação dos automóveis, dando bilhões de incentivos à indústria automobilística. Nessa mesma época, até a China (de Xangai a Pequim), diz Lores, já começava “a cobrar taxas pesadas das licenças para motoristas e, assim, tentar reduzir o número de carros nas ruas”.
Pode-se notar que, independente das medidas pró-automóvel, todas elas foram definidas e adotadas por partidos diversos e, aparentemente, de ideários opostos e divergentes. O que nos leva a concluir que quando o assunto é mobilidade urbana, queda evidente que não há partido nem ideologia a apartar os apoiadores do automóvel como prioridade absoluta dos investimentos e das atenções nas ruas e avenidas das cidades. Eles estão todos do mesmo lado.
Basta um rápido olhar nas propostas de muitos candidatos a prefeito de grandes cidades do país para perceber que esta dessincronia, a depender deles, irá perdurar ainda por muitos anos. Aumentar a velocidade, acabar (ou reduzir) as ciclovias, tirar o privilégio dos ônibus na circulação nas ruas da cidade, são medidas que agradam em cheio aos mais ricos (também chamados de “formadores de opinião”), mas não resolvem de forma alguma sua principal queixa, o problema da circulação. Antes de vítimas, eles não conseguem perceber (ou se negam a fazê-lo) que são, na verdade, os principais responsáveis.
Além de agravar os já complexos e perenes problemas da maioria dos que dependem do transporte público para trabalhar, estudar e viver a cidade, a insistência nessa dessincronia torna a cidade mais violenta, menos amigável, mais cara e, por conseguinte, menos competitiva.
O efeito que tal mentalidade produz no imaginário do motorista de automóvel é arrasador, pois passa-lhe a mensagem do “tudo posso”. Essa sensação de soberba ocasiona o desrespeito às faixas de pedestres e aos pedestres de maneira geral (marca registrada de nove entre dez motoristas); justifica o tempo semafórico breve para as travessias (para não atrapalhar “o fluxo”); explica as reclamações constantes e com forte apoio midiático contra a “indústria da multa” (como se o direito de descumprir regras fosse sagrado para quem dirige um automóvel); encurta as calçadas, tornando-as extensão das garagens e do asfalto…
Há inúmeras maneiras de se medir o grau de civilidade de uma cidade. Uma delas, sem dúvida, é o comportamento no trânsito, que utiliza o indicador mais cruel que pode existir: o número de vítimas (mortes e lesões). Tanto melhor e mais civilizada será uma cidade quanto menos mortes e acidentes de trânsito ela apresentar. Não perceber que para tanto é preciso que a cidade tenha menos carros (e menos velozes), boas e largas calçadas acessíveis, mais bicicletas e pessoas andando a pé, é uma prova de ignorância ao que se passa no resto do planeta. Ou de desrespeito ao eleitor.
Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes e editor da ANTP – Associação Nacional de Transportes Públicos.

Lançada identidade que permite que jovens de baixa renda viajem de graça ônibus interestaduais

Diário do Transporte

ônibus grátis jovrensGratuidade é apenas em ônibus comuns. Serviços como leito e semileito ainda devem ser pagos pelo jovem
ID Jovem pode ser solicitada pela internet ou por meio de aplicativo
ADAMO BAZANI
A Caixa Econômica Federal e a Secretaria Nacional da Juventude lançaram oficialmente a ID Jovem, identidade que permite que jovens de baixa renda (dois salários mínimos) utilizem gratuitamente ônibus e trens interestaduais (que ligam estados diferentes).
O documento também garante acesso gratuito ou descontos em espetáculos culturais.
A ANTT – Agência Nacional de Transportes Terrestres regulamentou a gratuidade no dia 31 de março de 2016, mas os jovens de baixa renda, com idades entre 15 e 29 anos, beneficiados pela medida, não conseguiam estar isentos das passagens porque a ID Jovem ainda não era emitida.
O benefício também garante 50% de desconto nas passagens, quando as duas vagas gratuitas nos ônibus e trens já tiverem se esgotado.
Vale lembrar os jovens ainda terão de pagar a taxa de embarque e os pedágios, já que as isenções totais ou desconto de 50% são apenas para o valor da passagem.
A ID Jovem pode ser solicitada pela internet ou por meio de aplicativo de celular.
Confira como:
SITE DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL:

APLICATIVO ID JOVEM
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes

Integração tarifária entre cinco linhas intermunicipais de Guarulhos começa neste sábado

Diário do Transporte

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Segundo a EMTU, desconto será possível apenas com o cartão BOM. Economia será de 45% e o acesso ao Metrô Armênia deve ser mais fácil
ADAMO BAZANI
Tem início neste sábado, 1º de outubro de 2016, a integração tarifária entre cinco linhas intermunicipais gerenciadas pela EMTU – Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos, em Guarulhos, na Grande São Paulo.
De acordo com a gerenciadora do Governo do Estado, as mudanças vão beneficiar principalmente os moradores do Jardim Munhoz.
O valor da tarifa integrada será R$ 5,20, o que representa uma economia de mais de 45% aos usuários metropolitanos.
A integração só será possível com o uso do Cartão BOM – Bilhete de Ônibus Metropolitano, da Autopass.
O bilhete pode ser feito nas lojas do Cartão BOM. Confira os endereços no sitehttps://www.cartaobom.net
Quem já possui o Cartão BOM não precisa fazer um bilhete específico para estas novas  integrações em Guarulhos.
Abaixo, a EMTU explica as linhas envolvidas e como ocorrem as integrações, que podem ser feitas em qualquer trecho do trajeto dos ônibus, preferencialmente na Avenida Guarulhos.
Linhas metropolitanas envolvidas
011TRO Guarulhos (Parque Continental II) – São Paulo (Metrô Armênia), via Rodovia Presidente Dutra
011PR1 Guarulhos (Parque Continental III) – São Paulo (Metrô Armênia), via Rodovia Presidente Dutra
100TRO Guarulhos (Parque Primavera) – São Paulo (Metrô Penha)
100BI1 Guarulhos (Jardim dos Eucaliptos) – São Paulo (Metrô Penha)
584TRO Guarulhos (Parque Primavera) – São Paulo (Metrô Carrão)

Economia nas integrações

– De R$ 4,35 por viagem na integração entre a linha 100TRO e 011TRO ou 011PR1
– De R$ 4,40 por viagem na integração entre a linha 100BI1 e 011TRO ou 011PR1
– De R$ 4,90 por viagem na integração entre a linha 584TRO e 011TRO ou 011PR1

O uso do cartão BOM para o pagamento das passagens é imprescindível para garantir o desconto no pagamento da tarifa integrada de R$ 5,20.

Local de Integração
A integração entre as linhas deverá ser feita em qualquer ponto de conexão entre elas, preferencialmente na Av. Guarulhos.

Formas de integração

Ida: para chegar a São Paulo (Metrô Armênia):
Se o usuário embarcar na linha 100TRO, no sentido de Guarulhos, pagará a tarifa de R$ 4,35 com o Cartão BOM, e em um dos pontos de conexão poderá embarcar na linha 011TRO ou 011PR1, no sentido São Paulo (Metrô Armênia), pagando o valor complementar de R$ 0,85.
Caso o usuário embarque na linha 584TRO, no sentido de Guarulhos, pagará a tarifa de R$ 4,90. Em um dos pontos de conexão deverá fazer a transferência para a linha011TRO ou 011PR1, no sentido São Paulo (Metrô Armênia), pagando o valor complementar de R$ 0,30 que será debitado no Cartão BOM.
Volta: para chegar a Guarulhos (Jardim Munhoz)
 O usuário embarcará na linha 011TRO ou 011PR1, sentido Guarulhos, e pagará a tarifa de R$ 5,20 com o Cartão BOM. Em um dos pontos de conexão das linhas fará a transferência para a linha 100TRO ou 100BI1, no sentido São Paulo (Penha), sem a necessidade de pagar outra tarifa, desde que use o Cartão BOM para passar pela catraca.
Se na volta quiser utilizar a linha 584TRO, o usuário embarcará na linha 011TRO ou011PR1, no sentido Guarulhos, pagará a tarifa de R$ 5,20, e em um dos pontos de conexão fará a transferência para a linha 584TRO, no sentido São Paulo (Metrô Carrão), sem debitar nenhum valor no Cartão BOM.

Expansão da Linha 9 deve ficar para 2018

AUTOR: CAIO LOBO 

viatrolebus
Foto: Cecilia Bastos | Imagens USP
Mais uma obra de expansão da rede metroferroviária de São Paulo deve atrasar. A vez agora é a extensão da linha 9 – Esmeralda, da CPTM, que vai ligar a estação Grajaú a Varginha, com 4,5km e 2 novas estações.
O Governo do Estado agora alega necessidade de se adequar às exigências feitas pelo Ministério das Cidades, que vai financiar 60% da obra (R$ 500 milhões) com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a CPTM decidiu encerrar no fim deste ano os contratos assinados em setembro de 2013 com os dois consórcios responsáveis pela construção e fazer uma nova licitação para concluir a extensão da Linha 9.
De acordo com a CPTM, com a nova licitação o prazo da entrega da obra deve ser de 18 meses após a retomada das obras o que deve acontecer somente em 2018.
Em nota, a companhia informou que a ampliação da Linha 9 foi incluída no PAC da Mobilidade em 2014 e que, até agora, as obras estão sendo feitas com recursos do governo do Estado. Segundo a estatal, o encerramento dos contratos foi necessário para“readequar o cronograma físico-financeiro às exigências do PAC”.
“O Ministério das Cidades informou que nos próximos dias emitirá autorização para que a CPTM inicie os processos licitatórios necessários, de acordo com as regras do PAC, para dar continuidade às obras e posterior liberação de recursos da União”, afirma a companhia.

Linha 2 do metrô de Salvador faz primeira viagem teste

AUTOR: RENATO LOBO 

viatrolebus
Na manhã desta quinta-feira, 29 de Setembro, foi feita a primeira viagem-teste da Linha 2 do Metrô da Bahia, que ligará Salvador à Lauro de Freitas. O trem percorreu 1,5 quilômetros entre a Estações Detran e Rodoviária.
O Governo Estadual promete entregar o primeiro segmento, entre o trecho testado e a Estação Acesso Norte até o final do ano. As construções tiveram início em fevereiro de 2015 e estão 69% concluídas, com o cronograma de conclusão no segundo semestre de 2017. Segundo a CCR Metrô, as paradas Acesso Norte e Detran já estão concluídas e a estrutura da Estação Rodoviária está 80% pronta.
O passageiro deve percorrer o trecho Acesso Norte e a Estação Aeroporto em 27 minutos, passando pelas 13 estações: Acesso Norte, Rodoviária, Pituaçu, Mussurunga, Aeroporto e Lauro de Freitas, que terão integração com os ônibus, além das Estações Pernambués, Imbuí, CAB, Flamboyant, Tamburugy, Bairro da Paz e 2 de Julho que não farão a integração.

TAV Chinês de dois andares vai transportar passageiros e cargas

AUTOR: RENATO LOBO 

A empresa chinesa CRRC Corporation apresentou um novo conceito de trem de alta velocidade capaz de transportar passageiros e cargas. O novo projeto com foco em “abrir novos mercados” é pensado para atender uma demanda intercontinental.
O trem será construído de dois andares, transportando passageiros no nível superior e mercadorias na parte inferior do vagão. O projeto foi apresentando na InnoTrans, feira do setor metroferroviário ocorrida na Alemanha.
Na divulgação do novo trem, a CRRC diz que o comboio será “adaptado para atender vários climas e ambientes, bem como diferentes sistemas ferroviários e as normas”.

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

O que aconteceria se o transporte público desaparecesse?

Todos os dias, 185 milhões de europeus usam um meio de transporte público para se locomover

El País


Um ônibus da empresa EMT, em Madri, capital da Espanha. ÁLVARO GARCÍA



Existe gente que nunca o utilizou e há quem não poderia viver sem ele. Caluniadores ou partidários, o transporte público urbano é uma realidade em constante crescimento, e uma opção diária de 185 milhões de passageiros europeus, que o utilizam para se locomover durante os dias úteis do ano. Os dados divulgados pela União Internacional do Transporte Público (UITP) revelam que, em 2014, 58 bilhões de deslocamentos foram registrados em territórios da União Europeia (UE) a bordo de trens, ônibus e metrô. E se, de repente, todos esses meios desaparecessem e só pudéssemos nos mover usando nossos veículos particulares ou não motorizados?
Além de facilitar a locomoção, os meios públicos de transporte são aliados bastante válidos para reduzir o trânsito e os níveis de poluição. A extinção desses pilares da urbanização e impulsores da industrialização teria consequências econômicas, ambientais e sociais relevantes. As grandes cidades seriam as primeiras a sofrer com o seu fim: ficariam totalmente engarrafadas devido ao aumento da circulação de carros e motos pelas ruas, e sucumbiriam com a alta emissão de gases nocivos.
“Mas isso não vai acontecer”, tranquiliza o secretário-geral da Associação de Empresas Gestoras de Transporte Urbano Coletivo da Espanha (ATUC), Jesús Herrero. Durante a Semana Europeia da Mobilidade 2016, um evento organizado, todos os anos, pela UE e cuja última edição teve início na sexta-feira, a ATUC publicou um estudo que analisa as consequências negativas de um hipotético desaparecimento do transporte público urbano. “É um exercício para refletir sobre algo que é muito importante em nossas vidas, apesar não nos darmos conta por estarmos acostumados a ele”, afirma Herrero.

O preço de se privar do transporte público

O último Liveability Ranking 2016 - a lista de cidades com a melhor qualidade de vida do mundo elaborada, todos os anos, por The Economist Intelligence Unit - menciona, entre as razões para não incluir os grandes centros internacionais de negócios entre as primeiras posições de sua classificação, a sobrecarga das infraestruturas relacionada à elevada densidade da população. Esse cenário não é uma realidade longínqua que só afeta cidades das dimensões de Nova York ou Tóquio: as previsões da ONU apontam um progressivo aumento da população urbana, que, em 2050, chegaria a representar dois terços do total, e fomentaria o nascimento de megacidades.
O relatório da ATUC toma Madri como referência, e reúne os dados do Observatório de Mobilidade Metropolitana (OMM) para analisar como os habitantes da capital espanhola se deslocam. A escolha do meio de transporte a ser utilizado não se baseia apenas na disponibilidade, mas também varia em função da distância a ser percorrida: quando o trajeto é interno, prevalece o uso do transporte público e dos meios não motorizados, mas o carro e a moto ganham de lavada quando o deslocamento é entre a cidade e algum outro ponto da zona metropolitana, apesar de os veículos privados terem os mais elevados custos unitários por passageiro, tanto sociais (tempo de viagem e acidentes) quanto econômicos (infraestrutura e operação) e ambientais, em comparação com ônibus, metrô e trem.
Assim, se o metrô e os ônibus urbanos da empresa EMT deixassem de funcionar – 2.000 vagões e 2.000 veículos a menos –, seria preciso encontrar uma solução alternativa para oferecer transporte às 3,4 milhões de pessoas fazem uso desses meios diariamente (de segunda a sexta-feira). Nenhuma das possibilidades consideradas pelo relatório da ATUC é positiva: 2,5 milhões de veículos a mais nas ruas – a Direção Geral de Tráfico contabilizou mais de três milhões em Madri, em 2014 –, o que congestionaria os pontos nevrálgicos da cidade. Isso também dobraria o número de acidentes, aumentaria a quantidade de motos e ciclomotores, e afetaria, até mesmo, a rotina de trabalho dos cidadãos, que teriam que modificá-la com o objetivo de reduzir os tempos de viagem. Isso sem mencionar as consequências ambientais e os problemas para estacionar.
Em 2013, havia cerca de 170.000 vagas, controladas pelo Serviço de Estacionamento Regulado, na zona central da capital, e outras 18.000 entre as destinadas a pessoas com mobilidade reduzida e as reservadas para carga e descarga, das quais apenas 111.000 eram utilizadas. No entanto, se houvesse apenas um milhão de veículos a mais em circulação, esse número de vagas já não atenderia à demanda. Além disso, mais carros e motos nas ruas implicaria um aumento de episódios de altos níveis de contaminação do ar, o que resultaria em mais frequentes proibições do acesso de veículos ao centro da cidade.
A essas externalidades negativas “tangíveis”, se acrescentariam outros efeitos “nocivos”: desde a perda generalizada da qualidade de vida devido à maior duração dos traslados e à pior qualidade do ar, até a impossibilidade, de certos coletivos, como cegos e pessoas com mobilidade reduzida, de se locomoverem de maneira autônoma. Além disso, ter carteira de motorista e um meio de transporte privado se tornaria um requisito indispensável para trabalhar ou satisfazer qualquer outra das necessidades das pessoas que não vivem perto de uma zona comercial.

E se o transporte não fizesse falta? O desafio da eficiência

Herrero diz que o estudo realizado pela ATUC não “é uma campanha contra o carro”, e também não aponta o transporte público como o remédio contra todos os males. “É uma maneira de dizer que há alternativas, porque, além do transporte público, acreditamos que caminhar é fundamental, e essa é uma atividade que deve ser incentivada, assim como andar de bicicleta, usar o carro de forma compartilhada (carona) e tudo aquilo que possa reduzir o número de veículos na cidade”, afirma.

“É possível traçar uma rota de maneira quase instantânea”

“A Semana Europeia da Mobilidade é uma ocasião extraordinária para dedicar alguns dias a esse tema, mas o transporte urbano também pode melhorar sua eficiência”, ressaltou Herrero.
De acordo com um estudo elaborado pelo Institute for Transportation and Development Policy (ITDP) e pela Universidade da Califórnia, se o transporte público fosse melhorado, e o uso de meios não motorizados impulsionado, as emissões de dióxido de carbono poderiam ser reduzidas em 40%, a nível mundial, até 2050. Do mesmo modo, a possibilidade de ir de um lugar ao outro a pé ou de bicicleta, ou aproveitar o trajeto em transporte público entre a casa e o trabalho para se dedicar, de maneira cômoda, a outras atividades - ler, escutar música, etc - reduz o estresse e melhora a saúde, de acordo com o estudoHousing for Inclusive cities: the economic impact of high housing costs (Moradias para cidades inclusivas: o impacto econômico dos altos custos das residências,em tradução livre), da Global Cities Business Alliance.
São vários os projetos direcionados a melhorar os serviços de transporte de uma maneira geral, que vão desde o investimento em infraestrutura, como novas ciclovias, até a implantação de métodos de pagamento mais rápidos e integrados a nível geográfico, e projetos menos específicos, como o de cidades inteligentes. “Tudo vai estar conectado, sensores serão utilizados e a tecnologia permitirá que o transporte público também seja, cada vez mais, sob demanda”, garante Herrero. “É possível traçar uma rota de maneira quase que instantânea”, insiste. “Esse é o futuro: transformar a mobilidade em algo muito mais fácil para as pessoas”.

“Carro mata mais que arma de fogo em São Paulo, mas não é mais notícia”

“Carro mata mais que arma de fogo em São Paulo, mas não é mais notícia”

Especialista diz que desafio de ampliar restrição a carros é "cultural, não é técnico"


El País
O ativista Carlos Aranha. VICTOR MORIYAMA
Uma pequena volta pelas ruas da maior metrópole da América Latina é suficiente para perceber que o automóvel continua sendo "o rei de São Paulo". Ainda que o prefeito Fernando Haddad tenha sido apelidado de "rei da tinta" por ter criado novos quilômetros de ciclovia pela cidade, as áreas destinadas às bicicletas representam menos de 1% do espaço público, explica Carlos Aranha, especialista em mobilidade urbana e integrante do Conselho Municipal de Política Urbana, coletivo ligado à Prefeitura com participação de integrantes do poder público e da sociedade civil para o debate do tema. Aranha também atua na Rede Nossa São Paulo, o conjunto de ONGs e instituições civis que tem acompanhado de perto e cobrado a gestão municipal. No momento em que se reacende o debate sobre ciclovias e segurança com a morte nesta sexta de uma ciclista em São Paulo, dias após o choque com um ônibus, ele rebate: "Questionar as ciclovias ou o uso da bicicleta diante de uma morte no trânsito é tão absurdo quanto culpar o comprimento da saia de uma vítima pelo seu estupro".
Pergunta. Quais as soluções para que os diversos modais de transporte possam conviver juntos ?
Resposta. Para todos os dilemas existem decisões técnicas e decisões políticas, embasamentos dos dois lados. Quando você fala que vai reduzir a velocidade nas marginais para melhorar o trânsito, isso é totalmente técnico. Já quando se fala nessa redução para evitar mortes, claro que há um embasamento técnico, - porque quanto menor a velocidade, menor o impacto em um acidente, isso é provado – mas tem também o político. Você pode dizer: não importo da cidade matar 600 pessoas atropeladas por ano, eu prefiro manter altas velocidades por um motivo X, já que não acredita no embasamento. Quando falo de motivação política, é no sentido de política pública, de pensar o que é melhor para o bem comum. Quando Nova York, por exemplo, lançou o programa Vision Zero, de zerar as mortes no trânsito, a decisão foi de política pública. Depois, também perceberam que a medida ajudou na fluidez do trânsito, no congestionamento. Se você comparar São Paulo com Nova York você percebe que a nossa cidade ainda está atrasada.
Questionar as ciclovias ou o uso da bicicleta diante de uma morte no trânsito é tão absurdo quanto culpar o comprimento da saia de uma vítima pelo seu estupro
P. Que políticas ainda precisam ser implementadas aqui?
R. O Vision Zero têm 3 pilares: primeiro, a redução de velocidade máxima, segundo, a geometria das ruas, quanto elas se mostram convidativas para a velocidade. Por exemplo, no caso da marginais, as pessoas estranham tanto 50 km/h, porque ela tem cara de rodovia, ela te convida a correr mais. São muitas faixas, são largas, espaço livre grande, os raios das curvas foram feitos pensando na velocidade. Se você simplesmente reduz a velocidade, sem mudar a geografia da rua, (o chamado Traffic Calming- moderação do Tráfego) com elementos na rua que falam para os motoristas que é preciso andar mais devagar, as pessoas vão estranhar. Por isso digo que está correto o que está sendo feito aqui em São Paulo, mas ainda está incompleto. Por exemplo, a rua Avanhandava, no pé da Augusta, recebeu um tratamento de Traffic Calming. Todo mundo que entra nela reduz a velocidade.  Ela tem um piso de concreto intertravado que faz um barulho, tem a calçada no mesmo nível da rua, árvores 'entrando' no meio da rua, você sente que é um local para tomar cuidado, para baixar a velocidade, por isso é importante a geometria. Já o terceiro pilar usado em Nova York  é a fiscalização de trânsito constante. Eles realmente atuam com dureza na penalização das infrações de trânsito. Levam isso a sério todos os dias da semana, durante todos os horários. O que acontece hoje em São Paulo é que a fiscalização é feita principalmente em dias úteis no horário comercial. A Polícia Militar tem um efetivo muito pequeno e prioriza infrações que não necessariamente atentam contra a vida. É muito comum ver no relatório da CET multas de rodízio, de zona azul, já o desrespeito a faixa de pedestres há muito poucas infrações. Não é porque não acontece, mas porque não está sendo punido.
Hoje atropelamos e matamos 2 pessoas por dia com carro em SP. Isso não é notícia porque virou algo natural, não se indignam, e não é. Isso é uma carnificina urbana diária. Apesar da imensa violência urbana que temos na cidade, hoje carro mata mais que arma de fogo na cidade de SP. Só que já não é notícia
P. E os radares?
R. Eles são um grande problema no Brasil. As pessoas reduzem só para o radar, cumprem e depois voltam a acelerar o carro. Na prática não adianta nada, teríamos que ter fiscalização 24 horas por dia, para todas as infrações, em especial para as que atentam contra a vida. É preciso incluir também a lei seca aí, ela tem o mesmo problema do radar. Todo mundo sabe onde a Blitzs é montada, tem twitter e outras formas de descobrir. Mas nos locais onde ela realmente funciona, ela acontece de forma aleatória. Nos Estados Unidos, por exemplo, os policiais ficam escondidos. Como no Brasil há essa previsibilidade é fácil burlar. Dos três pontos do Vision Zero, estamos terríveis ainda na fiscalização, começando a discutir a geometria das ruas e estamos efetivos na redução de velocidade.
P. Alguns setores alegaram que essa redução tinha por trás um interesse na arrecadação de dinheiro com multas de alta velocidade...
R. Conceitualmente esse argumento é uma grande besteira. Afinal, dinheiro de multa não é arrecadação livre, ele já tem destino orçamentário previsto. Então ele já vai para um fundo que tem várias atribuições, entre elas investimento em educação de trânsito (que sentimos um pouco de falta de mais investimentos), não vão transferir para construir um hospital, e tudo isso é transparente. Acho que quem faz esse tipo de acusação precisa mostrar. E se realmente tivesse acontecendo algum desvio a sociedade teria que saber, porque seria gravíssimo, mas você falar da boca da fora, que é uma tentativa de arrecadação não faz sentido.
P. Nos últimos anos, a mobilidade melhorou?
E não é à toa que quem não leva a mobilidade urbana a sério apelida o atual prefeito de'rei da tinta' e 'suvinil', porque é tão simples redistribuir o espaço público, que chega a parecer errado. E não é
R. Se for considerar que estamos entre as 5 maiores metrópoles do mundo e que São Paulo é a maior cidade do Brasil, cujo trânsito mais mata no mundo, não é difícil constatar que estamos vergonhosamente décadas atrasados. Por outro lado, se considerarmos, o tipo de individualismo e egoísmo que se manifesta na população e especial na mídia paulistana, no momento que você tenta colocar uma agenda mais progressista, eu diria que finalmente estamos conseguindo avançar. Estamos tentando compensar um atraso de décadas, de políticas erradas, que sempre privilegiaram o carro, o que é burro tanto do ponto de vista de política pública quanto do conceito técnico, porque você trava a cidade inteira. E foi sempre o que São Paulo fez, convidar a todos a usarem carros, a ter seu próprio carro. E criou também um trânsito muito perigoso, ruas perigosas, em que você não vê idosos, não vê crianças, nem deficientes. Você vê pessoas sempre com medo, acuadas, com cuidado para atravessar, para virar porque está todo mundo com sua pressa e seus motores ameaçando a vida. Não é à toa que temos 7.000 atropelamentos por ano. Agora a agenda que vem sido colocada pela atual gestão é progressista no sentido de proteção a vida e de equalizar os modos possíveis de transporte na cidade. Quando você começa a investir nos modos ativos de deslocamento, pedestre e bicicleta majoritariamente, e no transporte público, você começa a dizer que você vai usar o carro se você quiser, mas você tem ótimas opções. Pra fazer isso, inevitavelmente você precisa tirar espaço físico do carro.
Outra opção que considero errada é adesão do monotrilho suspenso, porque já nasce saturado, com a capacidade menor do que a demanda daqueles bairros sugerem. E também estão atrasados. O metrô é importante e todos defendem tanto sem muita ressalva porque ele não atrapalha tanto o carro
P. E qual o maior desafio para realizar esse redesenho do espaço público?
R. Do ponto de vista técnico é muito fácil. O grande desafio é a questão da opinião pública de uma cultura que já está instaurada. Hoje temos 17.000 km de ruas asfaltadas na cidade de São Paulo, que há 20 anos atrás era para todos, você entupia de carros individuais, ônibus , bicicletas...Para que você consiga equalizar o transporte público é necessário dividir e fazer espaços exclusivos para que funcione melhor. O exemplo mais óbvio é o ônibus, é um veículo que poluí duas ou três vezes mais que um carro, só que ele carrega 100 vezes mais que um carro. Então você tem que dar uma faixa exclusiva, não só uma, mas duas, para permitir ultrapassagem. Começou, mas ainda estamos tímidos. O desafio é de opinião pública, cultural, não é técnico. E não é à toa que quem não leva a mobilidade urbana a sério apelida o atual prefeito de rei da tinta esuvinil, porque é tão simples redistribuir o espaço público, que chega a parecer errado. E não é. Quando você pinta uma faixa branca e diz aqui é só passa ônibus é o caminho correto. Pinta de vermelho para a bike, você está fazendo política pública. É tão simples que revolta as pessoas, elas acham que talvez tivessem que criar minhocões pela cidade inteira para resolver o trânsito e não vai. É só você ver qualquer iniciativa semelhante no mundo para ver que não dá certo. Los Angeles, por exemplo, passou décadas investindo em viadutos e túneis e não adiantou, o trânsito continua travado. Agora eles estão começando a ver que precisam investir em transporte coletivo público de qualidade. Não existe nenhuma cidade grande no mundo que tenha resolvido seu problema de mobilidade urbana investindo no transporte individual motorizado.
Claro que o ciclista tem que tomar cuidado com o pedestre, não importa se ele está atravessando fora da faixa, nada justifica uma morte ou você ferir uma pessoa. O que temos hoje na cidade é uma inversão total disso, o automóvel é o rei da cidade e todos têm medo dele
P. Apesar disso parte da população ainda desconfia sobre a eficácia das ciclovias e de um redesenho urbano. No mês passado, a morte de um pedestre em uma ciclovia gerou um debate grande...
R. Na escola de jornalismo, se aprende que um avião decolar e pousar não é notícia, já se explodir no ar, aí sim é. Hoje atropelamos e matamos 2 pessoas por dia com carro em SP. Isso não é notícia porque virou algo natural, não se indignam, e não é. Isso é uma carnificina urbana diária. Apesar da imensa violência urbana que temos na cidade, hoje carro mata mais que arma de fogo na cidade de SP. Só que já não é notícia. O código de trânsito é claro, há um artigo que diz que a hierarquia da rua prevê que o maior sempre será responsável pelo menor, da mesma forma que o caminhão precisa ter cuidado com os carros ao redor, o carro cuida da moto, a moto da bicicleta, a bicicleta do pedestre, todos juntos cuidam do pedestre. Isso resolve tudo, claro que o ciclista tem que tomar cuidado com o pedestre, não importa se ele está atravessando fora da faixa, nada justifica uma morte ou você ferir uma pessoa. O que temos hoje na cidade é uma inversão total disso, o automóvel é o rei da cidade e todos têm medo dele. Aí você tem um modo de deslocamento que sempre existiu, que antes de qualquer ciclovia, já havia um índice de 300 mil ciclistas na cidade por dia, e que agora começa a ganhar relevância porque é uma novidade pra cidade, vem gerando discussão. O plano da Prefeitura é implementar 400 km de ciclovia, isso significa menos de 2% dessas ruas, toda essa polêmica entorno de 2% de ruas que estão ganhando uma parte delas para criar uma infraestrutura dedicada aos ciclistas como um convite para que as pessoas usem a bicicleta como meio de transporte. Se você considera a área do espaço público, viário de muro a muro, tudo que está implementado de ciclovia representa menos de 1% desse espaço e, se você somar com todas as faixas exclusivas de ônibus e corredores, você não passa de 1% do espaço público da cidade. Não estou contando parques, estou falando de área viária. E se isso gera ainda tanta polêmica e grito é porque as pessoas ainda acreditam que nós ainda temos alguma solução possível na crença do transporte individual motorizado.
Você pode dizer: não importo da cidade matar 600 pessoas atropeladas por ano, eu prefiro manter altas velocidades por um motivo X, já que não acredita no embasamento. Quando falo de motivação política, é no sentido de política pública, de pensar o que é melhor para o bem comum.
P. Nesta sexta, a morte de uma modelo que se chocou com um ônibus enquanto pedalava na av. Faria Lima voltou a reacender o debate sobre a segurança das ciclovias. Como avalia?
R. Questionar as ciclovias ou o uso da bicicleta diante de uma morte no trânsito é tão absurdo quanto culpar o comprimento da saia de uma vítima pelo seu estupro. Ciclovias existem justamente para dar segurança e conforto às pessoas. Nada priva o condutor do automóvel da sua obrigação prevista em lei: o cuidado irrestrito do maior pelo menor, sempre, em qualquer situação. Me preocupa bastante ver tanto alvoroço em torno das mortes que envolvem uma bicicleta (foram 3 casos este ano em São Paulo) e nenhuma menção às 30.000 ocorrências de trânsito, com 1.500 mortes, sempre causadas por automóveis, na mesma cidade, todo ano.
P. E qual a situação do metrô?
R. No sistema brasileiro temos um caso peculiar, já que o transporte ferroviário é responsabilidade estadual e o transporte sobre pneus dentro da cidade é responsabilidade do município. Com isso você fica dependendo da boa vontade do político eleito da cidade e do estado de terem um diálogo e ajudar. Mas dado essa ressalva dessa separação, o metrô de São Paulo é pífio, a evolução é muito lenta. O que temos na prática hoje é um sistema de ônibus carregando duas vezes mais o que o metrô carrega. As viagens de ônibus em SP chegam a 10 milhões por dia e o metrô mal chega a 4,5 milhões. Então, considerando as características do metrô de transporte de massa de altíssima capacidade e com mais espaço de carregar mais gente em menos tempos é claro que deveria carregar mais gente. Teríamos que ter uma rede muito maior do que ela hoje. Se você pega o planejamento dos anos 90 de SP, hoje teríamos que ter uma rede com o dobro de tamanho, e o que vemos atualmente é o contrário. Vemos estações serem inauguradas com 5, 7, 10 anos de atraso. Outra opção que considero errada é adesão do monotrilho suspensa, porque já nasce saturado, com a capacidade menor do que a demanda daqueles bairros sugerem. E também estão atrasados. O metrô é importante e todos defendem tanto sem muita ressalva porque ele não atrapalha tanto o carro.